LIBERDADE, ONDE ESTÁS? QUEM TE DEMORA?
(...)
Chamar a um novo plano de austeridade, o
enésimo de há dois anos para cá, sempre precedido da mentira de que "não vai ser
necessária mais austeridade", mais uma vez sobre os funcionários públicos, os
pensionistas e os que precisam de serviços públicos de saúde, educação, e
outros, essa coisa obscura e neutra de "medidas contingentes", não é também um
insulto à nossa inteligência e, pior que tudo, uma ofensa aos que vão ser
vítimas daquilo que o Governo chama "desvios na execução orçamental", ou seja
erros? A verdade, nua, bruta, cruel, dura, pétrea, é que cada vez que o Governo
erra, há um novo plano de austeridade destinado a garantir que a mesma receita
que falhou seja tentada de novo, com mais uns milhares de milhões retirados às
pessoas, às famílias, à economia, para pagar uma obstinação, um beco sem saída
ideológico, uma tese sem prova, uma abstracção intelectual, no fundo uma enorme
vaidade sem perdão. Sócrates deitou fora milhões e milhões mal gastos e
perdulários, Passos Coelho deita fora milhões e milhões para um vazio de
arrogância, ignorância e vaidade, sem melhorar o défice, aumentando a dívida,
sem se ver qualquer utilidade. Mas o dinheiro, antes como agora, foi para algum
sítio.
E como aceitar o supremo insulto fruto de uma
displicência que acaba por ser maldosa e arrogante, de se dizer que a recessão
para este ano "aumenta de um ponto percentual", como se passasse de 35,4 para
36,4, quando passa de 35,4 para 70,8, usando estes números imaginários para se
perceber a enormidade do "ponto percentual" que significa errar por 100%,
duplicar por dois uma desgraça, que passa a ser o dobro do que era, ou seja uma
pequena coisa, "um pequeno ponto percentual", como se fosse a coisa mais natural
do mundo.
Os erros agora também se chamam "ajustamentos"
e podem ser tidos apenas como a natural consequência da "dificuldade das
previsões macroeconómicas", que se tem que ir "ajustando" mês a mês. Mas os
erros antes de serem "ajustados" acaso não foram instrumentos de combate
político, fonte de afirmação de legitimidade, atirados contra todos os que
suspeitavam da sua verdade e exequibilidade? Não tem importância, encontra-se
uma estatística qualquer que mostra que estamos no "caminho certo", mesmo que
tudo esteja errado, e há sempre quem coma esta palha.
É tudo "ajustamento" porque os manipuladores
das palavras entendem que, lá fora da sua janela do poder, tudo é plástico que
se pode moldar, é tudo paisagem em que se pode plantar uma sebe alta para não
ver o mais de um milhão de desempregados "em linha com o que estava previsto", e
colocar os portugueses numa jaula de ratinhos a correr para fazer experiências.
E que tal cortar metade da comida a ver se eles se "ajustam" à "poupança" de só
comer metade? Trinta morrem, quarenta ficam doentes, vinte ainda têm gordura
para aguentar. Aguentam, aguentam, diz o tratador. Excelente, ficam dez por
cento, a "selecção natural" funcionou e deixou-nos com os mais fortes, os que se
"ajustam", os "empreendedores". Morreram alguns comidos pelos outros? Não há
problema, sempre há ratinhos "empreendedores" e que não são "piegas", e que
mostram as virtudes do modelo.
No dia em que este Governo for corrido, pelo
mesmo tipo de onda de rejeição que varreu o seu antecessor, só que agora do
tamanho das ondas do Canhão da Nazaré, vai sair com a atitude daquele que diz: o
último a sair que feche a luz e a porta, porque já não é connosco, "queríamos
mudar Portugal e não nos deixaram". E irão para os seus lugares de acolhimento
confortável, já pensados e preparados, sem temor e sem tremor.
No entretanto, estragaram Portugal com a mesma
sanha do filósofo de Paris, numa situação que vai demorar décadas para ser
consertada, se é que tem remédio. Descaracterizaram o PSD como Sócrates fez ao
PS, tornaram pestíferos os políticos em democracia e as instituições da
democracia, destruíram a geração actual, a que tratam sobranceiramente como a
dos "instalados" e querem desempregar para "ajustar" o preço da mão-de-obra, e
hipotecaram a geração seguinte com a mesma antiga maldição da baixa
qualificação, do provincianismo, do quotidiano de subsistência onde não há
recursos para os bens materiais quanto mais para os "imateriais".
Vão deixar-nos na periferia da periferia, como
um país eternamente assistido por uma Europa para quem pagar ao seu bom aluno
são trocos desde que ele se porte bem. Irá a troika, ficará o BCE, a
Comissão Europeia e o Pacto orçamental. Ficará um país medíocre e remediado, uma
praia razoável para o Verão. Deles vamos herdar uma enorme colecção de invejas e
ressentimentos sociais, que dividirão os portugueses entre si, aumentando ao
mesmo tempo a apatia e a violência social.
Não é bom viver no Portugal onde reina o engano
e a mentira institucionalizada. E não custa prever o futuro. Está tudo nas
palavras.
(Fonte e artigo completo: José Pacheco Pereira, In ABRUPTO)
2 comentários:
Está provada a forma como este governo joga. Acabou com o sector da construção em Portugal, sobraram as empresas onde o estado tem mais amigos.. Agora vão "reanimar" a construção atirando notas para cima dos amigos das empresas que sobraram, para construírem coisas desnecessárias e em duplicado, barragens que a EDP vai usar para fazer milhões comprando de borla a energia das ventoinhas e vendendo mais caro aos contribuintes que pagam as suas barragens.
O Estado só atira dinheiro para onde houver um amigo, seja banqueiro ou accionista da mota-engil, ou o Mexia, que fala na tv como se tivesse sido ele que agarrou numa pá e construiu toda a EDP até ser privatizada. Se me dissessem que estes 5000M eram para reabilitar os edifícios do Estado para deixarem de pagar somas astronómicas de rendas aos amigos que constroem CAMPUS de Justiças nos parques das nações deste belo país, eu apoiaria. Em suma, é preciso mudar tudo, para que continue tudo na mesma...
Cumprimentos
Infelizmente tudo o que diz é verdade. (Isto e muito mais).
Estou de acordo consigo.
Cumprimentos
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