António Mexia sempre defendeu menos Estado e mais sacrifícios para garantir o futuro do País. Estado nunca lhe faltou. Sacrifícios é coisa que não parece conhecer.
"Terão que se assumir sacrifícios no curto prazo por forma a obter vantagens no médio prazo, devendo esta geração evitar carregar inutilmente as próximas." São estas as palavras de António Mexia que se podem ler no site dos liberais caseiros do Compromisso Portugal. Só que, como de costume, quando Mexia diz que se terão de assumir sacrifícios não está a falar dele próprio.
Soubemos esta semana que Mexia recebe 3,3 milhões por ano. O mesmo que 500 trabalhadores com o salários mínimo nacional. Aquele salário que, por ser aumentado em vinte euros, iria, garantiram as associações patronais, rebentar com a nossa competitividade. Recordo o que aqui já escrevi: os nossos gestores recebem em média 32 vezes mais do que os trabalhadores mais mal pagos das suas empresas. Na Alemanha a média é 10 vezes mais. Querem mesmo falar dos salários e da competitividade das nossas empresas?
Dirão: a EDP é uma empresa privada. Não temos nada a ver com isso. Acontece que é uma empresa privada que foi pública e onde o Estado continua a ser o maior accionista. E que vive em regime de monopólio. O ordenado de Mexia é pago pelos consumidores que não podem decidir mudar de empresa. E, recorde-se, o preço da electricidade doméstica em Portugal é, em termos absolutos, superior ao da média comunitária. Na factura lá estão o salário e prémios de António Mexia.
E acontece que o currículo de António Mexia, apesar de se tratar de um convicto liberal sempre a pedir menos Estado, é bastante esclarecedor: foi Adjunto do Secretário de Estado do Comércio Externo, Vice-Presidente do Conselho de Administração do ICEP, Presidente dos Conselhos de Administração da Gás de Portugal e da Transgás, Vice-Presidente da Galp Energia, Presidente Executivo da Galp Energia, Presidente dos Conselhos de Administração da Petrogal, Ministro das Obras Públicas, Transportes e Comunicações, Presidente do Conselho Geral da Ambelis e representante do Governo Português junto da União Europeia no Grupo de trabalho para o desenvolvimento das redes transeuropeias. Agora está na EDP. Tirando a sua vida académica e uma passagem pelo Banco Espírito Santo, trabalhou sempre, seguramente contrariado, para o Estado ou para empresas participadas pelo Estado. E quase sempre por escolha política.
Este homem, que fez a sua vida profissional à boleia da política e do Estado, quer menos Estado. Faz-se pagar como os 200 que mais recebem nos EUA e exige sacrifícios a bem das próximas gerações.
E foi ele mesmo, sempre lesto a gritar pelo mérito, que contratou, se bem se recordam, Pedro Santana Lopes (seu ex-primeiro-ministro) para assessor jurídico da EDP. Porque os amigos são para as ocasiões.
E fez este senhor parte desse patusco encontro de gestores que exigiu, em 2006, o congelamento salarial dos funcionários públicos. Sacrifícios, já se sabe, têm de ser feitos
São estes homens, transformados pela imprensa em oráculos da Nação, que nos dão lições de competitividade, meritocracia e estoicismo para vencer as adversidades. Falam de cátedra. Mas não sabem do que falam.
.
Sem comentários:
Enviar um comentário